Ambiência de Edifícios Históricos A importância de contextualizar os monumentos mais importantes.
Sempre que um edifício é protegido por tombamento, além das consequências deste ato para o imóvel, as normas de patrimônio exigem a criação de uma área no entorno desse bem que sirva de amortecimento para possíveis impactos negativos sobre ele. Essa preocupação surgiu a partir do momento em que os edifícios deixaram de ser considerados de forma isolada, como monumentos de valor artístico e estético em si mesmos. O italiano Gustavo Giovanonni chamou a atenção para a importância de uma “arquitetura menor”, ou de acompanhamento que ajuda a contextualizar os monumentos mais importantes. Passou-se então a considerar que era preciso manter a ambiência na qual os bens de valor patrimonial estão inseridos.
Isoladamente, desvinculados de um contexto mais amplo, eles perdem sentido, se tornando objetos autônomos, anacrônicos em relação à paisagem na qual estão inseridos. Essa ideia da proteção do entorno foi então absorvida pelas cartas internacionais de patrimônio e incorporada às legislações de cada país.
Considerando muitos dos centros históricos italianos, espanhóis, franceses a ideia do entorno é realmente importante. Trata-se, em sua maioria, de conjuntos edificados bastante homogêneos, isto é, que preservam, em linhas gerais, a imagem historicamente consolidada de uma determinada linguagem arquitetônica. Assim, há núcleos urbanos de perfil predominantemente barroco, eclético, renascentista, de influências árabes ou ainda composto por elementos de diferentes épocas mas que guardam um caráter homogêneo. Nesses lugares um elemento que altere de forma drástica a ambiência termina realmente comprometendo a fruição da atmosfera daquele lugar ou de um monumento de especial relevância. Ou seja teria-se uma paisagem homogênea com objeto estranho se destacando no meio dela.
Também aqui no Brasil há cidades com centros históricos que possuem essa característica. Podemos pensar em Ouro Preto, Olinda, Alcântara, mas…faz sentido tratar dessa forma o entorno de bens tombados numa cidade, por exemplo, como Fortaleza?
As áreas ditas históricas de Fortaleza possuem um caráter heterogêneo. Ou seja, sua paisagem, em geral, foi muito alterada ao longo do tempo. Fachadas descaracterizadas, volumetrias desconfiguradas, alterações internas para acolher estacionamentos. O entorno da maioria de nossos edifícios tombados já se encontra intensamente transformado. Faz sentido então impor uma série de restrições aos imóveis vizinhos para manter a ambiência do edifício tombado? Pela nossa lei municipal, “qualquer alteração física, de mobiliário, de uso ou de iluminação” de imóveis do entorno de um bem tombado somente se dará após prévia autorização do órgão de patrimônio. Parece uma restrição demasiado rígida, para um objetivo bastante impreciso. Qual ambiência se pretende preservar? A baderna visual existente? Ou a ideia é recriar uma atmosfera que já não existe? Em muitos casos a poligonal de entorno poderia coincidir com a limitação do lote, não faz nenhum sentido estender as restrições à vizinhança do imóvel.
É óbvio que essa condição não se aplica a toda a paisagem urbana de nossa cidade. Há zonas nas quais se observa uma certa coerência na paisagem, mas o certo é que esses setores homogêneos são exceção à regra. Um boa estratégia seria levar em conta que quando se trata de analisar de intervenções em bens de valor patrimonial, cada caso é um caso, por mais paradoxo que isso possa parecer. Ter como horizonte as diretrizes consolidadas nas cartas, normas e entendimentos internacionais mas analisar cada caso de acordo com suas particularidades. A normativa descontextualizada do espírito no qual ela surgiu só torna o patrimônio cada vez mais antipático e incompreensível para as pessoas.
Como Citar essa Matéria
PINTO, Jober. Ambiência de Edifícios Históricos. Projeto Batente, Fortaleza - CE, 26 de agosto de 2020. Arquitetura. Disponível em: <https://projetobatente.com.br/ambiencia-de-edificios-historicos>. Acesso em: [-dia, mês e ano.-]