Peixe morto na praia: o problema das “mulheres na arquitetura”
A complexa sobreposição de questões raciais e de gênero na prática arquitetônica

Meu interesse pelas questões de gênero, dentro e fora da arquitetura, não é segredo. Por conta disso busco muitas referências e leituras sobre o assunto. E em uma dessas buscas me deparei com o Matri-Archi, que é um coletivo interseccional que reúne as mulheres para capacitar e desenvolver as cidades africanas e a educação espacial. Lá eu vi esse artigo, e é sobre ele que vou falar rapidinho aqui.

Nesse artigo, Khensani De Klerk faz um comparativo do mercado de trabalho com uma praia aonde os homens brancos já estão há um bom tempo sentados na areia macia.  Os homens negros estão ali, sentados na água, segundo a autora “ainda tem o privilégio de respirar ar fresco enquanto seus pés permanecem encharcados“. Depois viemos nós, mulheres brancas, nadando sem descanso nem conseguir encostar o pé no chão.  E, só depois, estão as mulheres negras, “afogadas nas profundezas dos oceanos“. Às vezes, em uma rara ocasião, uma mulher negra chega à praia e, quando chega lá, é chocante para todos, inclusive ela.

Quantas arquitetas negras você conhece?
Quantas meninas negras estudaram com você?
Quantas professoras negras você teve?!

Algo muito forte que Khensani fala é “Aqueles que se aquecem na praia não sabem o que significa se afogar“. Até mesmo eu que estou aqui nadando sem conseguir colocar o pé no chão não posso falar por quem não consegue nem isso. Só elas, que estão naquele espaço podem dizer algo. A autora até fala que a intenção dela com esse artigo não é encontrar uma solução imediata, por mais que fosse ótimo, o objetivo é fazer com que quem está em outras áreas da praia perceba que há questões que precisam ser discutidas e visibilizadas.

A arquitetura é percebida como um neutro ideal, o que não é. O que não falta são dados para mostrar que há desigualdade de gênero entre arquitetos e arquitetas. Khensani mostra dados Sul Africanos, mas o que não faltam são pesquisas, mundo a fora, provando que há desequilíbrio racial e de gênero palpável na profissão. Na verdade, uma rápida zapeada no Arch Daily já consegue provar isso.

“Mulheres na arquitetura” NÃO é um grupo homogêneo. É preciso sim bater na tecla que há diferenças históricas entre homens e mulheres. Mesmo quando há algumas como Jane Jacobs, Lina Bo Bardi e Eve Ensler, e outras poucas mulheres (brancas) solteiras que chegam às prateleiras da história isso não quer dizer que as oportunidades são as mesmas. Quer dizer que em um universo onde 67% das profissionais são mulheres (pelo menos aqui no Brasil), ter só alguns destaques femininos não é o suficiente.  Retrospectivamente, se a profissão continuar com essa tendência, o registro arquitetônico continuará sendo um espaço definido por homens brancos.

Todos temos o direito de respirar na nossa praia.

Não deixem de ler o artigo original, mesmo que seja ligando o tradutor do Google.

Como Citar essa Matéria
MARANHÃO, Jade. Peixe morto na praia: o problema das “mulheres na arquitetura”. Projeto Batente, Fortaleza - CE, 25 de setembro de 2019. Arquitetura e Urbanismo. Disponível em: <https://projetobatente.com.br/peixe-morto-na-praia-o-problema-das-mulheres-na-arquitetura. Acesso em: [-dia, mês e ano.-]

 

Jade Maranhão
Arquiteta e Urbanista
Ariana com ascendente em Câncer e cabeça na lua. Casada, feminista, sem filhos. Muito café e chocolate. Nasceu no século passado com a cabeça no século seguinte.
Facilidade para aprender, planejar e gerir projetos, desenhos manuais, softwares de edição de imagens e playlists animadas. Detalha projetos, faz maquetes eletrônicas, tem a criatividade aguçada, sabe fazer o quadradinho. Odeia goiaba.
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