Arquitetura tem futuro?
Uma das razões de eu ter escolhido ser arquiteto foi o desenho animado “Os Jetsons”. A ideia de desenhar edifícios que flutuavam no ar era irresistível. Só muito depois soube que Niemeyer tinha tentado, mas eram truques, “malandragens do mestre”, não flutuavam de verdade. Os meus, queria que levitassem de fato. Do outro lado estava Newton e suas maçãs cadentes, falando da gravidade, leis e impossibilidades.
Foi difícil, mas aceitei com o tempo e até achei bonitos os edifícios de força tectônica que pareciam brotar do chão numa espécie de fúria geológica. As catedrais góticas, a arquitetura românica, pirâmides , templos e essas coisas que usamos pra fazer as provas de História da Arquitetura. A ideia de prospecção do futuro, no entanto, nunca abandona totalmente o trabalho de um arquiteto. Modernismo, futurismo italiano… A turma sempre dando uns toques de como ia ser, já sendo. O amanhã hoje era uma obsessão. Aviões, carros, trens, foguetes…tudo em movimento. Uma sociedade cinética vibrava intensamente, porem, nada de prédios voando…
Fui entendendo devagarinho que para uma arquitetura ter futuro precisa ser antes uma crônica do seu tempo e do seu lugar. Contar sua história e se oferecer como material de uma arqueologia pós punk apocalíptica…Marcar lugar no amanhã é saber falar do hoje. No futuro, em uma Fortaleza submersa, os pesquisadores descobrirão ruínas de um projeto que você fez ali no Meireles e é esse seu projetinho que vai ajudar a contar para eles como a gente vivia aqui e agora.
Quanta responsabilidade! Por isso é necessário seriedade na hora de projetar, pensar naquilo como ruína, como vestígio, como mensagem na garrafa. Os drones submarinos recolherão fragmentos desse edifício e os levarão à belíssima sede do departamento de arqueologia e proteção do patrimônio que, enfim, estará sobrevoando lentamente o que antes era um lugar chamado Pirambu, agora no fundo do oceano. Nesse momento, lá do paraíso (ou do inferno) reservado aos arquitetos, você contemplará a cena e concluirá finalmente que sua arquitetura teve futuro porque ela contou do presente.